Páginas ao vento

domingo, 14 de agosto de 2011

Saudade de meu pai

Sempre tive vergonha do meu pai. Vergonha por ele ser tão independente e diferente dos demais pais de amigos e familiares. Talvez a vergonha estivesse vinculada à ação dele em se marcar com tanta diferença. Diferença que gerou um estigma que se estendeu a todos nós, seus filhos. Qual adolescente quer ser diferente? Queríamos ser diferentes entre iguais, que não fossemos notados num âmbito mais geral.
Enfim, nos seus últimos anos, após deixar de beber, o conheci verdadeiramente e vi  a possibilidade dele se tornar meu amigo. Mas não deu tempo. Ele se foi na seqüência dessa percepção. Ficou uma última imagem, sofrida, em que me despedia dele à porta do quarto, no AP da rua Maestro Elias Lobo em Sampa.
Não o vi mais. No enterro, no Araçá, seu caixão estava lacrado, passei parte do funeral com Cezar Cardoso, meu primo, vagando por restaurantes no bixiga enquanto velavam seu caixão no cemitério. Não me lembro de ter conversado com alguém, sequer com meus irmãos, nesse noite, e mesmo depois, sobre a situação que se desenrolava a partir deste dia.
Porém, hoje, ao refletir sobre a vida que ele levou, ao refletir sobre seus sofrimentos e sua história, o compreendo. Sinto saudades, mas, de como poderia ter sido nosso relacionamento, como seria sua relação com minha família, com Neguinha e Peu. Mas, todos os acontecimentos que levaram minha família a trafegar por uma história difícil, serviram de escola para meu desempenho em minha vida profissional e das relações pessoais/sociais. Agradeço a meu pai por, através de seus feitos, me possibilitar o discernimento do que seria melhor para minha vida. Sua benção, meu pai. Espero, sinceramente, que você esteja imerso na luz do amor e da paz.
Meu pai à porta da farmácia Droga Costa em sampa, anos 1950.