Este texto é de uma entrevista à revista "Estação" para o dia dos pais em 2007 e que coloco, na íntegra, à tona novamente.
Profissão: Publicitário.
Pai de quantos filhos: um.
Idade dos filhos: vinte e um.
Nome dos filhos: Pedro.
São do primeiro casamento? Primeiro e único. São 25 anos de casamento, na verdade não nos casamos oficialmente. Vivemos juntos desde 1982, quando nos conhecemos na Unicamp.
Caso seu filho more longe, explica pra mim como é a relação de você com ele: Eu sofri muito quando o Peu saiu de casa, porque sou muito ligado nele e nos meninos todos que convivem em casa. Sempre levei no Karatê, no clube, nos lugares, na escola. Levava e ia buscar também, não importava a hora. Então, o cordão umbilical que foi cortado foi comigo. Ele não liga muito pra casa, somos nós que temos que ligar pra saber como vão as coisas, pra saber se ele tá precisando de algo. Mas ele é sossegado e tem ido muito bem na faculdade.
Como era a sua ideia de ser pai antes e como é agora? Eu nunca imaginei ser pai antes de o Pedro nascer. Não fazia idéia de nada. O primeiro banho que fui dar nele, eu coloquei uma sunga e ia entrar na ducha quando minha sogra falou:”_ Imagine!! O que é isso!! Quer matar o menino?!?”
Marinheiro de primeira viagem total. Depois você vai observando o ser se formando, te olhando e o amor vai se desenvolvendo, começa a aparecer nos sonhos e a compor sua vida.
Quando você descobriu que seria pai pela primeira vez, quais foram as maiores alegrias, o maior desespero, a maior preocupação? Nós já vivíamos juntos há 4 anos e já havíamos experimentado bastante situações da normalidade às mais estranhas que a juventude pode nos possibilitar. Então, a gravidez, parece, foi um sinal de mudança no sentido de nossas vidas e nós vimos isso claramente, mesmo porque já estávamos com 29 e 27 anos de idade. Não vou dizer que houve um sinal de alegria enorme pela gravidez, porque você nunca sabe o que é exatamente isso, o que vai vir, ou o que pode acontecer. Então, esse sintoma de alegria e desespero, que eu não encaro assim tão drasticamente, me parece, caminham juntos , como uma gangorra. Uma hora você está com os pés no chão e o real passa como um filme por você e você é ator nesse filme, outra hora, você vê o diretor dando ordens e não pode fazer nada, porque está só observando fora do espaço cênico. A preocupação grande foi cair dentro do mundo verdadeiro, que era o mundo fora da universidade, o mundo real, dos conflitos e do trabalho. O mundo que eu não vivia e que precisava acessar para começar a ganhar dinheiro e sustentar minha família. Mas era apenas uma preocupação, não um desespero, algo que se resolveu calçando-se os sapatos.
Você acha que conseguiria ser pai sozinho? Olha, eu falo que sou pai de um filho só, mas aí a Leila me lembra que eu ajudei a criar mais 6 garotos(as), filhos de amigos, que cresceram junto com o Peu. Criar no sentido de ajudar a inserir formação de vida e orientação para uma ética existencial, para que pudessem ser seres humanos bacanas, sem preconceitos. Mas não poderia ter sido pai sem a ajuda de minha companheira. E hoje em dia, não, não sei não. Vai depender de como a vida vai te colocar nessa situação, né?
Você se classificaria como que tipo de pai? Justo, brincalhão, que dá limites e que sabe os seus limites em relação aos espaços do filho também.
Para nós conhecermos um pouco de sua personalidade, gostaria de saber como seria um dia dos pais perfeito com a sua família, um lugar, uma situação: Então vamos lá: primeiro que eu não acredito em dias dos pais. Acho bobagem esse negócio de dia dos pais, dia das mães, dos namorados,, das crianças, etc... São datas comerciais, feitas com o intuito de se incentivar e de se objetivar vendas. Ou seja, são datas mercadorias. Eu tenho dias maravilhosos com o que eu chamo de tripé do amor, que é meu filho e minha mulher juntos comigo, deitados na nossa cama de casal, no quarto, com a janela aberta que dá de frente para as Murtas floridas e perfumadas no jardim. As janelas são enormes e ficamos os 3 ali fazendo cafuné, conversando, sem tempo nem necessidades. Ali falamos de tudo, mas é um espaço de intimidade dividida desde sempre e isso é lindo! Esse é um dia qualquer perfeito.
No caso, você é um publicitário, um artista, me conte um pouco do seu trabalho. E das suas atividades fora dele. Como é a relação da sua família com as suas atividades? Seu filho está no mesmo caminho? Sua mulher...: Hum...! Há muito respeito pelo espaço de cada um em casa. Tenho o atelier de pintura e o estúdio de criação em lugares diferentes da casa e quando estou trabalhando num deles, ninguém vai lá. Leila também tem o escritório dela, com a biblioteca, os livros ao lado do meu estúdio. Peu foi criado assim, com a gente sempre enfiado ou nos livros, ou nas tintas e na produção criativa. Mas nunca podei qualquer atitude ou vontade dele se integrar nessas atividades, o fato é que ele observou demais, eu acho, e escolheu um caminho diferente do nosso. Meu trabalho antigamente pedia mais contatos sociais, mais baladas e muitas saídas. Eu passava muito tempo cuidando de relacionamentos e do trabalho e pouco tempo em casa. Aí eu dei um breque nisso tudo, olhei a balança e optei pela qualidade em minha vida e não pela quantidade de trabalho que resultasse em mais dinheiro, que me possibilitasse fazer o que? Minhas duas estrelas estavam em casa e foi ali que eu resolvi ficar. Então terminei o mestrado e optei por dar aulas numa universidade, selecionar algumas consultorias em comunicação publicitária, que é o que tenho feito.
Peu estuda administração na Universidade Federal de Santa Catarina e pretende, se é que não vai mudar, fazer MBA na área de hotelaria.
Para você, pai, qual é a maior dificuldade para educar um filho? Olha, acho que os pais, hoje em dia, pecam pela falta de conversar com seus filhos cotidianamente. Não é chegar pro filho e falar: “_ senta aí e vamos conversar!”. É ser ao mesmo tempo pai e companheiro. Pai não é amigo, é pai mesmo, mas pode ser companheiro e deve falar, com carinho, sem imposição, sem podar o ser que está se formando, deve falar sobre tudo com grande disponibilidade e sem hipocrisia. Eu sei de histórias de pais que tratam seus filhos de uma maneira horrorosa, porque os meninos se descobriram homossexuais. Isso é um absurdo! O que o lance da sexualidade tem a ver com o amor dos pais? Então não havia amor antes? Os filhos nos ensinam a viver!
Diga pra gente, uma frase, um ensinamento, algo que você sempre diz ao seu filho, um conselho… ? Faça e seja feliz!
Como era o seu relacionamento com seu pai, como é hoje com seu filho? Putz, dá-lhe terapia!! Eu considero que não tive pai, porque a presença dele durante o tempo em que viveu, foi de um alcoólatra que chegava em casa sujo, com as roupas rasgadas e manchadas de sangue. Não tenho imagem de carinho dele para comigo, mas tenho muitas lembranças de violência e de gritaria. Eu acho o álcool uma merda. Acho que as campanhas publicitárias de bebidas alcoólicas deveriam ser mais regulamentadas, senão, banidas. O público não tem consciência do mal que o álcool faz, das mortes que causa e da ponte que ele é para outras drogas. De quantas famílias ele destrói. Eu tive problemas com álcool até 1993, quando parei radicalmente com tudo. Parei porque olhei para meu filho e na minha lembrança vi que poderia fazer diferente. Fiz diferente. Mudei a face do espelho, contei tudo para o Pedro, ele sempre soube de tudo, temos uma relação muito transparente em casa. E eu fico em cima quando o negócio é bebida alcoólica. Fico apavorado. Mas a gente se ama e nossa história é outra, graças a Deus.
Você precisou largar alguma atividade na vida de recém-casado ou até mesmo da vida de solteiro para embarcar na paternidade? Nunca. Eu já havia terminado a faculdade, Leila também, ela estava fazendo o mestrado na Unicamp e já havia cumprido os créditos. Eu trabalhava numa agência de publicidade em São Paulo, então, na verdade, minha paternidade começou aos 3 anos do meu filho, quando embarquei mesmo, numa maior proximidade de núcleo familiar, ao sair da agência em que trabalhava e me mudar para Londrina, que era onde eles já estavam morando. Acho que fui um pouco egoísta nessa época, mas foi necessário para que pudéssemos realizar outras coisas materiais.
Para finalizar, o que significa dia dos pais para você? Em termos comerciais e sentimentais: Bom, eu disse que é um “commerce day”, não é mesmo? Nós temos calendário pra tudo, que poderia ser melhor utilizado, no sentido de mercado. Pois temos sempre um dia marcado como sendo comemorativo para qualquer coisa que se queira imaginar. Deputados são os responsáveis por isso, sabia? Dia da avó, da sogra, dia do sapateiro, da manicure, do otorrino, dia do digitador e por aí vai. Isso é reflexo da fragmentação de nosso tempo, da nossa vida cotidiana que deixou de ser elástica. Nunca o relógio esteve tão acertado, no sentido de hora pra tudo. Os intervalos entre os ponteiros se encontram todos ocupados e têm etiquetas com preços e logotipos. Por isso eu acho qualquer dia comemorativo tão vazio de sentido. Porque a comemoração está focada no produto, e não, no institucional. Precisamos fazer um trabalho de “re-posicionamento” estratégico para as datas comemorativas principais, para que tenham mais sentido humano.
Obrigada: OK!